16/11/2021
Chama-se Maid, está na Netflix, e gostei muito. Muito mesmo. Não é que não tenha visto já coisas parecidas, não é que não estejam lá os estereótipos do ciclo da pobreza, do alcoolismo, do machismo feito normalidade, da violência doméstica desculpada pela doença, por um passado de m***a, por isto e por aquilo. Mas ainda que todos já tenhamos assistido a séries ou filmes com enredos similares, não deixamos de sentir (eu, pelo menos, senti) uma profunda claustrofobia e uma sensação de permanente beco sem saída, de espiral centrífuga para o inferno, de destino de m***a irremediavelmente traçado, por muito que se lute contra ele, mais ou menos como quando nadamos contra uma corrente forte (já se sabe, vai dar afogamento certo).
A série retrata a luta de uma mãe solteira, que se torna empregada doméstica em várias casas, para conseguir sustentar-se a si e à filha de 2 anos (e depois 3 anos). Os percalços que lhe acontecem mostram como, de facto, da mesma maneira como dinheiro puxa dinheiro, a falta dele faz com que tudo corra mal, como pedras deitadas em toda a engrenagem. Há imagens particularmente simbólicas, como ver aquela mulher a limpar de forma irrepreensível, enquanto, por outro lado, a sua vida parece cada vez mais suja, mais impossível de limpar.
A protagonista (Alex) é uma actriz do catano. Chama-se Margaret Qualley e transmite-nos tristeza, por vezes resignação, mas também garra, lucidez, maturidade, paciência e capacidade de se reinventar que devia - ainda que isto seja ficção - ensinar-nos uma lição a todos. A vida dela não tem nada que ver com a da minha amiga mas vi-a ali muitas vezes, quando ela luta e faz e se vira como se não estivesse a lutar e a fazer e a virar-se. Há ali uma dignidade silenciosa que me impressionou e que sempre me impressiona, talvez por ser tão diferente do modo como eu sou.
Andie MacDowell faz um papelão. Caricatural, absurda, bipolar, narcisista, totalmente doida dos cornos. Eu, se fosse filha dela (a protagonista Alex é a filha dela), não teria tido 1/5 da pachorra que ela teve para a aturar (a tal dignidade e maturidade de que falava).
Maid. De Molly Smith Metzler. Vejam, se puderem.